Uma extensa sessão temática no Plenário do Senado marcou, nesta terça-feira (19), um debate sobre a terceirização – a operação em que uma empresa prestadora de serviço é contratada por outra para realizar determinados serviços. O projeto (PLC 30/2015), já aprovado na Câmara, depende agora de votação no Senado, onde também suscita polêmica, dividindo parlamentares e representantes de trabalhadores e de patrões, muitos deles presentes no Plenário e nas galerias, ao longo da sessão.
A discussão, que reuniu por cerca de três horas autoridades, técnicos da área e representantes dos trabalhadores e dos empresários, mostrou a grande diversidade de opiniões existentes sobre o tema. A seguir, uma síntese das principais manifestações feitas durante a sessão temática.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, abriu os trabalhos sustentando que não é possível fazer ajuste fiscal cortando direitos trabalhistas e previdenciários. Ele disse que, na forma como se encontra, o projeto estabelece uma espécie de vale-tudo, quando, em sua opinião, o que a sociedade brasileira cobra é a regulamentação profissional, especialmente dos trabalhadores terceirizados que já estão no mercado de trabalho.
— Não dá para nós passarmos para a sociedade a ideia de que vamos fazer isso cortando direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores — disse Renan.
Numa posição semelhante, o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, também se manifestou resistente à mudança, dizendo que, da forma como veio da Câmara, o projeto da terceirização pode, sim, resultar em precarização das relações de trabalho, como temem algumas entidades de defesa dos direitos dos trabalhadores.
— Na medida em que não houver a construção de garantias que possam impedir a generalização da terceirização, entendemos que ela pode precarizar o trabalho — sustentou Manoel Dias.
Representante do Ministério Público do Trabalho (MPT), Helder Amorim disse que “a lógica da terceirização é uma lógica perversa” e que a iniciativa, tal como proposta no PLC 30/2015, é simplesmente inconstitucional. Sob aplausos, ele disse que a matéria “fere diretamente os direitos fundamentais dos trabalhadores e esvazia a função social da propriedade”. Também afirmou que a Constituição de 1988 foi a primeira a “fundamentalizar” os direitos dos trabalhadores, tornando-os indispensáveis ao próprio regime democrático.
Em sua exposição, o consultor jurídico da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Marcos Aurélio Ribeiro, afirmou que o Legislativo está tendo seus direitos usurpados face ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), que editou uma súmula sobre a terceirização, no vácuo da inexistência de lei que regule o tema no ordenamento jurídico brasileiro.
Marcos Ribeiro disse que essa súmula está prevalecendo até mesmo sobre leis existentes, que permitem a terceirização de algumas atividades. De acordo com o consultor, o próprio ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux já reconheceu a existência desse vácuo, apontando que a “súmula está legislando” inadequadamente.
Ricardo Patah, presidente nacional da União da União Geral dos Trabalhadores (UGT), fez críticas ao projeto, observando que ele traz discriminação, desemprego e redução da remuneração dos trabalhadores. Ele apelou para que o Legislativo construa um projeto adequado ao Brasil.
Já a secretária de Relações do Trabalho da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Maria das Graças Costa, criticou a proposta, afirmando que liberar a terceirização das atividades-fim vai na contramão das conquistas sociais dos últimos anos. Ela disse que, de cada dez trabalhadores que adoecem no Brasil, oito são terceirizados. E acrescentou: quatro, de cada cinco mortes, registradas em serviço também ocorrem com trabalhadores nessa situação.
O professor Hélio Zylberstajn, doutor em Economia da Universidade de São Paulo (Usp), exibiu slides para sustentar seu entendimento de que regulamentar a terceirização é uma decisão estratégica que o Brasil precisa tomar para aumentar a eficiência e a produtividade das empresas.
Zylberstajn defendeu a proposta prestes a ser votada no Senado ressaltando que, ao contrário do que dizem os críticos, o PLC 30/2015 vai melhorar a vida dos trabalhadores terceirizados, ao criar garantias e impor limites aos contratantes. Em sua opinião, não procedem as críticas de que a mudança vai precarizar as relações trabalhistas e tornar o mercado de trabalho uma selva.
João Carlos Gonçalves, secretário-geral da Força Sindical, disse que a terceirização da atividade-fim já existe, só que envolvendo trabalhadores organizados em sindicatos. Para ele, o projeto em vias de ser votado no Legislativo traz novas garantias e direitos aos terceirizados.
O presidente do Conselho Temático de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI),Alexandre Furlan, considerou incorreto associar a terceirização à precarização do trabalho. Para Furlan, precarizados são os mais de 45 milhões de trabalhadores informais, sem carteira assinada, recolhimento de INSS e fundo de garantia ou férias, formalmente assegurados pela lei.
O economista Marcio Pochmann, professor da Unicamp, também se manifestou contra a mudança ao afirmar que a ampliação da terceirização retirará trabalhadores de um segmento com menor rotatividade e maior remuneração. Em sua opinião, o resultado disso será a acentuação da desigualdade no mercado de trabalho.
Laercio José de Oliveira, deputado federal (SD-SE) e vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), disse que o projeto em tramitação garante segurança jurídica aos trabalhadores. Para ele, o único defeito da proposta é não abranger a terceirização do setor público.
— Me mostrem um direito que o projeto retira dos trabalhadores. Não existe. Nenhum direito do trabalhador é suprimido — desafiou o deputado.
Marilane Teixeira, representante do Fórum contra a Terceirização, afirmou que, ao contrário de contribuir para elevar a produtividade ou favorecer a competitividade, o projeto da terceirização visa reduzir os custos das empresas. Ela disse ainda que essa prática hoje atinge as atividades principais das empresas, mas é ocultada “sob o manto da informalidade”.
Ubiraci Dantas de Oliveira, presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), enfatizou que o PLC 30/2015 vai piorar a situação dos trabalhadores e que o caminho para a melhoria das empresas passa pela diminuição da taxa de juros e pelo controle do câmbio, mas não pela terceirização da mão de obra. No seu entender, os 12 milhões de terceirizados existentes hoje no Brasil enfrentam condições precárias e são tratados como trabalhadores de segunda classe.
Presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf chamou a atenção para o momento vivido pelo Brasil, marcado por crise econômica, crise política, falta de credibilidade e desconfiança. Skaf disse que este não é um momento para desunião, nem o momento para se dividir trabalhadores e empresários.
O presidente da Fiesp observou que a terceirização já existe há mais de 30 anos no Brasil e que faz parte da realidade do país. Em sua avaliação, o que se discute hoje é a regulamentação de uma coisa que está sem regulamento e que não pode funcionar de forma desordenada.
— Enfim, nós temos que ter uma regulamentação, e é isso que se está discutindo — destacou ele.
Skaf também disse que não é correto um trabalhador terceirizado não ter direito ao uso do refeitório numa empresa, do ambulatório, do transporte e dos serviços que lhe garantem cuidado com a saúde e segurança do trabalho.
— Isso não é direito e é por essa razão que é preciso regulamentar — sustentou Skaf.
Fonte: Agência Senado