Servidores portadores de moléstias graves e a isenção do I.R.

A Justiça vem aos poucos garantindo a isenção do imposto de renda – IRPF para os servidores na ativa que sofrem de alguma das moléstias enumeradas pelo inciso XIV do artigo 6º da Lei n° 7.713 de 22 de setembro de 1988, com fundamento nos princípios da isonomia e da dignidade humana.

 

A legislação determina que ficam isentos do imposto de renda “os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma”.

 

Para o legislador o benefício da isenção deve ocorrer sobre os rendimentos percebidos a partir do diagnóstico da doença, por meio de laudo médico oficial. Como o texto legal remete apenas aos proventos de aposentadoria ou reforma, os Tribunais pátrios afastavam a isenção aos servidores da ativa, com fundamento no consolidado entendimento de que a Legislação tributária deve ser interpretada de forma restritiva. Tanto que a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na sistemática do art. 543-C do CPC, em 09/08/2010, firmou entendimento de que a concessão da isenção se restringe às situações enumeradas no referido dispositivo legal (Recurso Especial n° 1.116.620/BA), conforme estabelecido pelo inciso II do artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN).

 

Todavia, esse entendimento tem sido revisto por alguns magistrados que se valem dos princípios da dignidade, da isonomia, da pessoa humana, da legalidade tributária, da capacidade contributiva, da progressividade, da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como do Direito fundamental à saúde e do Direito individual e social ao trabalho, para fundamentarem as suas decisões e garantir ao servidor da ativa a isenção do IRPF.

 

Ao conceder o benefício da isenção, o legislador objetivava aliviar o contribuinte, já abalado com o diagnóstico da moléstia grave, do aumento de suas despesas com remédios e com os tratamentos médico-hospitalares. Por isso, não há como ter diferenciação de tratamento ao aposentado e ao servidor da ativa, principalmente porque este último ainda tem que conciliar os seus afazeres com as inúmeras consultas e tratamentos médicos. As doenças descritas pelo legislador exigem cuidados constantes e, ainda que não estejam em atividade, como no caso do carcinoma, demandam rotineiros acompanhamentos médicos.

 

Nesse sentido, a jurisprudência garante o benefício da isenção até mesmo para aqueles que não possuem mais qualquer evidência de atividade da neoplasia maligna, pois o espírito da lei é o justamente favorecer o tratamento de portador da doença, ainda que seja para impedir sua manifestação no organismo.

 

Para o Tribunal Regional Federal da Primeira Região a concessão do benefício para servidores da ativa sequer precisaria de interpretação extensiva, pois o próprio caput do art. 6º da Lei nº 7.713/88, define que a isenção será sobre rendimentos, consequentemente, o benefício se aplica tanto para proventos/inatividade quanto para salário/atividade.

 

Como o artigo 43 do CTN, define o fato gerador da incidência do Imposto de Renda, o Il. Desembargador Luciano Tolentino Amaral assentou que “como sendo tributo incidente sobre “renda” [produto do capital/trabalho] e “proventos” [acréscimos que não forem renda], denotando que tais (Incisos I e II do item) são – ambos – “rendimentos”; se, para fins de tributação, proventos e salários dão-se as mãos para, unindo-se sob o color de “rendimentos”, oferecerem-se à tributação, assim também serão o mesmo todo para fins de isenção. Sanar tal incongruência, tal antinomia não é interpretação “extensiva” ou “analogia”, mas, sim, percepção do real alcance natural da norma e de sua sazonalidade de amplitude em função de variantes do tempo e espaço. A isenção toma, na hipótese, como elemento justificador objetivo, a “patologia enumerada” (com esteio na redução/perda da capacidade contributiva), para, em função dela (e somente dela), dizer isentos os rendimentos.”

 

Diante desses entendimentos, não há dúvidas de que somente a concessão do benefício de isenção para os servidores da ativa, portadores de doenças graves, irá garantir o seu direito fundamental a saúde, dando-lhe alívio financeiro para arcar com as inúmeras despesas com remédios e com os tratamentos médico-hospitalares.

 

Artigo: Sebastião Alves Pereira Neto é  Advogado e sócio do escritório Mundim Pereira Malveira Associados

Fonte: Correio Braziliense

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