Por três dias, Montevidéu se tornou a capital mundial do movimento sindical. Sede do Encontro Sindical Nossa América, o ESNA, a capital uruguaia recepcionou mais de 70 organizações sindicais de 19 países (a maioria das Américas, mas Europa e Asia também estavam representadas) com o objetivo de aprofundar o debate sobre a conjuntura mundial e a crise econômica que vem colocando em risco os direitos, a dignidade e a integridade de milhões de trabalhadores em todo o mundo.
A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB foi uma das entidades sindicais organizadoras do evento e levou ao debate o risco institucional vivenciado hoje no Brasil, compartilhando com os companheiros das Américas (e também do Japão e do Reino Unido) as ameaças aos direitos trabalhistas, às liberdades e às leis que lançam sobre o Brasil novamente a sombra do autoritarismo.
Ao final do encontro, um documento foi produzido coletivamente com uma agenda de lutas e um forte compromisso de princípios, defesa e solidariedade entre as nações. A “Declaração de Montevidéu” contempla os principais temas de consenso entre os países.
Vale notar que, sob o mesmo nome, foi lançado há 49 anos, em setembro de 1967, uma outra Declaração de Montevidéu, essa assinada pelo ex-presidente João Goulart que, exilado no Uruguai desde o golpe no Brasil, tentava junto à Frente Ampla (com Juscelino Kubitschek e outros) restaurar a democracia no país. O documento é um valioso libelo histórico em defesa da democracia, da liberdade e dos direitos dos trabalhadores.
Propósitos contemplados no ESNA e enaltecidos no encerramento do evendo no sábado (2). Divanilton Pereira, secretário de relações internacionais da CTB e coordenador da FSM Cone Sul, destaca a representatividade do coletivo presente no ESNA neste momento de conjuntura adversa. “O encontro teve um resultado positivo, reviu paradigmas e formulou uma pauta concreta, com ações focadas na articulação unitária, defesa da democracia e valorização do trabalho: eixos fundamentais para a construção de uma nova proposta civilizatória”, diz ele.
Abaixo, a agenda apresentada pela Declaração de Montevidéu das ações combinadas entre todos os paíes presentes no encontro para este ano:
- Jornada mundial em solidariedade à Venezuela no dia 19 de abril de 2016.
- Jornadas continentais de 18 a 25 de maio de 2016, de luta em defesa da
democracia, da soberania, da integração, dos direitos sociais e especialmente a defesa
do direito à greve e contra a criminalização da luta social.
- Jornada pela retirada das tropas do Haiti em 1 de junho de 2016.
- Solidariedade com as liderança sindicais e sociais que estão presas: Julia Amparo Lotan (Guatemala), Milagro Sala (Argentina), Huber Ballesteros, Oscar López (Puerto Rico preso nos EUA) e os 13 companheiros camponeses do Curuguaty no Paraguai; exigimos liberdade imediata.
- Reparação às família dos 43 assassinados no México, como parte da luta do povo mexicano.
- Reconhecimento da luta histórica do SME, desde sua autonomia de classe.
- Solidariedade com a luta da classe trabalhadora francesa contra reforma trabalhista que está em curso.
Desde o ESNA, convocamos a todos a lutar por estas demandas no 4/11, para promover uma grande jornada continental sem exclusões e lutar a favor da democracia, da paz, da integração soberana dos povos, dos direitos sociais, do direito à greve e outras reivindicações de nossos povos; e contra o livre comércio que sustenta as transnacionais e o imperialismo. A data escolhida é para comemorar o histórico Não à ALCA declarado em 2005.
Viva o VII° ESNA!!!
Viva a unidade internacionalista das trabalhadoras e dos trabalhadores!!!
Montevidéu, 2 de abril de 2016”
Integração e mídia
Entre todos os países presentes, as diferenças não são tão expressivas quando as semelhanças vivenciadas por suas trabalhadoras e trabalhadores nestes tempos em que o movimento sindical mundial enfrenta uma inflexão dramática após mais de uma década de avanços.
Brasil, Paraguai, Venezuela, Argentina e Honduras são alguns dos países que sofrem diretamente com a ofensiva imperialista e do capital, com ataques à liberdade sindical, criminalização de movimentos sociais, redução de direitos e violência da soberania nacional.
A Declaração de Montevidéu denuncia agressões aos direitos humanos e a tentativa imperialista de frustrar os tratados internacionais firmados entre os países da região, principalmente a Unasul, Celacl e Alba:
“A realização do VII ESNA acontece em um momento de profunda crise mundial do capitalismo e uma brutal ofensiva imperialista contra os povos de todo o mundo. Na América há a intenção de acabar com alguns avanços em matéria de mudanças políticas e integração, caso da ALBA-TCP, a UNASUL e especialmente a CELAC, que exclui de sua organização os EUA e o Canadá. É evidente a ofensiva imperialista em Honduras e no Paraguai, e agora na Venezuela, no Brasil e na Argentina. No plano geopolítico, se pretende limitar o papel da China, sua aproximação com a Rússia e agrupamentos como os BRICS. É um claro exemplo de hegemonia contra qualquer intenção de multilateralismo das relações internacionais.”
O documento também deu destaque para a necessidade de conscientizar os trabalhadores e formar opiniões que fujam da maciça dominação dos grandes grupos de mídia comprometidos com o poder econômico que continuam a dominar os meios de comunicação.
“A desigualdade e empobrecimento generalizado de nossos povos é consequência direta do regime capitalista e de suas propostas de saída da crise que ocultam a manipulação da consciência social promovida pelas classes dominantes. Neste sentido se destaca o papel dos meios de comunicação concentrados e propriedade de consórcios de mídia de caráter transnacional. Trata-se de uma estratégia integral que modula a cultura social majoritária para afirmar um sentido comum favorável aos interesses dos que mandam e dominam a sociedade contemporânea”.
E para isso, frisou a importância de se investir nas mídias alternativas:
“Importante destacar os esforços de integração dos meios de comunicação, entre os quais se pode mencionar a Telesur, com a qual assumimos o compromisso de ser solidários, e toda manifestação de comunicação popular”.
Leia o documento na íntegra, em espanhol, aqui.
Portal CTB – Natália Rangel – Foto: Paulo Nobre
Fonte: CTB